Amor que vai de Timbó até Timbó Grande

O casal Neusa e Orides Bauler viaja toda semana mais de três horas até chegar em Timbó Grande, no meio-oeste catarinense

Por Aline Brehmer 04/04/2019 - 15:53 hs
Foto: Marcelo Dias/Jornal Café Impresso
Amor que vai de Timbó até Timbó Grande
Sempre que o sol aparece, o casal encara os mais de 200 quilômetros de viagem de moto

A segunda-feira é tudo, menos um dia rotineiro na vida do casal timboense Neusa Antunes e Orides Bauler. Antes das 10h, sempre no primeiro dia da semana, eles embarcam em sua moto e percorrem mais de 230 quilômetros. O motivo? Levar Neusa até o trabalho, que fica em Timbó Grande. Ou seja, para Orides a viagem é em dobro, já que no dia seguinte ele precisa retornar até Timbó para trabalhar também.

A vida do casal, que está junto há seis anos, foi marcada por coincidências e surpresas. A primeira delas foi a forma como se conheceram – através da internet, em um site de bate-papo.

“Ela me disse que morava em Timbó, então pensei: opa, é aqui perto. Mas na verdade ela morava é em Timbó Grande, só que quando descobri isso já não fazia mais diferença, queria ficar com ela. Desde então as viagens semanais, que duram mais de sete horas (contando ida e volta), passaram a fazer parte de nossas vidas”, relata Bauler.

Fiorina: a aventureira

Pouco tempo após começarem a namorar, Neusa decidiu vir morar em Timbó com o companheiro. Professora a vida inteira, ela trabalhou como ACT (contratada por caráter temporário) em quatro escolas da cidade.

Entretanto, Neusa havia feito um concurso público em Timbó Grande e sido aprovada para lecionar na rede estadual de ensino. Quando veio para cá havia conseguido uma licença de dois anos e, assim que a mesma encerrou, retornou para dar aulas no meio-oeste catarinense.

“Faz cerca de três anos que a gente tem essa rotina de ida e volta. Como tenho um apartamento alugado lá sempre que vou e fico durante 15 dias, aí volto para cá. Nesse tempo o Orides vem me ver, mas não é sempre. Tem fins de semana que a gente só mata a saudade com ligações e WhatsApp mesmo”, relata a professora.

Apesar de preferirem ir de moto pelo “prazer de sentir o vento, pela emoção da viagem e por ser mais rápido” (nas palavras de Neusa), optar pelo carro se torna inevitável por três razões: quando o tempo não colabora, quando Neusa precisa levar muito material junto até Timbó Grande ou pela Fiorina.

O terceiro motivo pelo qual escolhem viajar de carro está junto com a gente na cozinha, perambulando por todos os lados e curiosa – a doce e amada Fiorina, cachorrinha que o casal resgatou e adotou.

“Hoje ela é parte da família, sempre está conosco. Nunca imaginamos ter um cachorro, mas agora não conseguimos ver como seriam nossos dias sem ela. É nossa companheira e aventureira também”, comenta Bauler.

A superação de Neusa

Enquanto o casal nos recebe para a entrevista, aos poucos, começam a relembrar de momentos que ficaram marcados na memória – e da influência que tiveram um na vida do outro. Neusa sempre foi apaixonada pelo estudo. Hoje, formada em licenciatura na disciplina de História, conta que quando começou a trabalhar como professora não tinha diploma – e nem mesmo o segundo grau completo.

“Trabalhei durante 11 anos em uma empresa privada até que surgiu a oportunidade de começar a dar aula em Timbó Grande. A realidade lá é completamente diferente. Isso aconteceu na década de 80 e, como eu tinha o nível básico de estudo, pude começar a dar aulas para os pequenos”, relembra.

Mas ela não se acomodou. Na primeira oportunidade que teve Neusa voltou a estudar e cursou tanto o ensino médio quanto superior junto com sua filha, Juliane da Costa (que hoje reside em Rodeio).

“Nos formamos juntas duas vezes e hoje ela também é professora, mas não foi fácil. Só tinha faculdade em Caçador, então a gente precisava viajar cerca de duas horas, em um ônibus, todos os dias”, conta.

Nova fase na vida de Orides

Há mais de 200 quilômetros de distância, Bauler também tomava novos rumos em sua vida. Hoje ele já é aposentado, mas tem cargo efetivo na Prefeitura de Timbó e ainda trabalha como vigilante.

Apaixonado por sua moto e principalmente por rádios, sempre se dedicou a entender o funcionamento dos aparelhos. Depois de conhecer Neusa, ele também se sentiu motivado para dar continuidade aos estudos.

“Fiz o ensino médio também e, atualmente, estou fazendo o curso de piloto. Sempre gostei de ler só que nunca me interessei em fazer uma faculdade de fato. O curso é difícil, mas aos poucos vou avançando”, comenta entre risos.

Neusa comenta que irá se aposentar neste ano e, quando isso acontecer, vai vir morar definitivamente em Timbó – mas não se vê longe das salas de aula. Por isso está fazendo o curso de pedagogia à distância.

“Se tudo der certo me formo ainda neste ano. Depois que me aposentar quero conseguir um emprego para trabalhar com as crianças daqui”, revela.

Afinal, como é Timbó Grande?

Lá em 2013, quando se conheceram, Neusa não imaginava que existia uma cidade chamada apenas “Timbó”. Já Bauler nunca tinha ouvido falar sobre um lugar chamado “Timbó Grande”, mas ficou impressionado com as diferentes realidades dos dois municípios.

“Em comum é só o nome mesmo. A começar por dados, Timbó Grande é menor em extensão territorial e população, abrigando cerca de 9 mil habitantes. Mas, de forma geral, lá existe uma realidade bem diferente daqui de Timbó”, comenta. Neusa, que tem a cidade do meio-oeste catarinense como sua segunda casa, diz que a situação no local é precária. Mas, por outro lado, se enche de orgulho ao falar o quão dedicados e esforçados seus estudantes são.

“A comunidade como um todo é muito receptiva e as crianças têm uma sede por aprender. Você dificilmente vai encontrar uma professora em Timbó Grande que não tenha, pelo menos, dois diplomas de faculdade. Se eu compará-la com Timbó, diria que aqui na Pérola do Vale temos escolas de primeiro mundo”, analisa.

Viagem, café e belas paisagens

Quando questiono o casal sobre o percurso de toda semana, eles relatam que fazem o trajeto por Papanduva, economizando tempo (e paciência) além de, claro, fazer umas paradas tranquilas para tomar aquele café antes de seguir viagem. Bauler conta que quando precisava passar pela BR-470 não era somente o trânsito que incomodava, mas sim os riscos que passavam na rodovia.

“Por Papanduva a gente pode ir tranquilo. Não deixo a Neusa ir sozinha porque acho perigoso. É um trajeto tão longo para uma pessoa fazer sem ninguém ao lado, então faço questão de acompanhar ela. Além disso sempre somos presenteados com paisagens lindas, não tem como enjoar das viagens”, diz.

Neusa, por sua vez, desabafa que está ansiosa para se aposentar, mas admite que irá sentir muita saudade de Timbó Grande quando realmente partir. “Uma grande parte da minha história foi construída lá junto às crianças, àquela comunidade. Vai ser bem difícil sim, mas vou voltar para visitar sem dúvida”, garante.

Unidos por Deus (e pelas famílias)

Além de Juliane, que tem 35 anos, Neusa tem mais um filho de seu primeiro casamento, o Eduardo Antunes, de 38 anos. Bauler também tem um casal de filhos de seu primeiro casamento: a Nádia Eliete Bachmann, de 36 anos e o Cleiton Fernando Bauler, de 32 anos.

Hoje ele é avô de uma menina e a professora é avó de três crianças. Toda orgulhosa, ela mostra as fotos dos momentos em família que têm no seu celular, sempre junto aos filhos e enteados.

“Todo fim de semana, principalmente quando nós dois estamos em casa, esse lugar fica cheio. São risadas, brincadeiras e amor por todos os lados. É bom demais. Amamos os momentos em família, sem dúvida são os melhores”, diz Neusa.

Diante da incrível história que o casal conta, eles fazem questão de frisar quem sempre esteve à frente de tudo para que as coisas dessem certo: Deus.

“Sem Ele não somos nada. Tem a distância e as dificuldades, mas isso faz parte da vida. Quem nos sustenta para lidarmos com tudo da melhor forma possível, sempre fortalecendo nossa relação e nossos corações, é Deus”, agradecem.