“Amo minha profissão e faria tudo de novo”

Há gerações a família Peyerl atende famílias de Timbó e região, para realizar consertos de sapatos e outras peças

Por Aline Brehmer 27/04/2018 - 11:04 hs
Foto: Rafael David/Jornal Café Impresso
“Amo minha profissão e faria tudo de novo”
Há mais de 40 anos Romualdo Peyerl é sapateiro e hoje trabalha junto com seu filho, Jean Douglas

A realidade hoje é, acima de tudo, ligada à tecnologia das mais diversas formas e com apoio de inúmeras ferramentas. Diante dessa rotina tão automática, o trabalho manual é algo que tem sido cada vez mais valorizado e procurado. Muitas são as profissões que exigem esse toque pessoal, que se preocupa com cada detalhe e dá um ar diferente às peças fabricadas.

Principalmente quando se fala em restauração, esse é um método de trabalho é muito procurado. Quem comprova isso é o empresário e sapateiro Romualdo Francisco Peyerl, de 57 anos. Desde 1976 ele tem a Sapataria Peyerl em Timbó e revela algo surpreendente.

“Todos os dias recebo clientes aqui, muitos que já são conhecidos, outros que vêm pela primeira vez. É ao contrário do que as pessoas pensam, não é falta de procura pelo serviço, mas sim de pessoas interessadas em aprender o ofício”, desabafa.

Cada peça, um trabalho

Diante de tantos materiais utilizados hoje para confeccionar essas peças, Peyerl faz um alerta. “Há muitos produtos novos que são descartáveis, coisas que não dá para arrumar. Sempre fazemos uma avaliação justa. Por exemplo, se o sapato custa R$ 240,00, vale a pena pagar R$ 50,00 para arrumar. Mas se o concerto for mesmo o valor do sapato, não compensa”, analisa.

Hoje, para o profissional, o toque especial nesse (e em qualquer trabalho) é a qualidade – mas ela tem um custo. “Muitas pessoas pensam que o conserto é barato, mas são duas mãos de obra ali. A primeira é para tirar o que está estragado e a segunda para refazer aquilo, então, não existe milagre nisso”, explica.

Fabricação própria

Além de consertar calçados, a família Peyerl também confecciona alguns deles, como alpargatas e rasteiras. Quem é o responsável por fazer o design da marca é o próprio Romualdo. Porém, no que diz que respeito ao trabalho como um todo, ele destaca a participação da família.

“Meu filho Jean Douglas Peyerl, de 30 anos, está há 18 deles comigo. Quando ele nasceu eu e minha mulher, Rita Michalack Peyerl, de 56 anos, já trabalhávamos com isso, então ele sempre viveu nesse meio e conforme foi crescendo, aprendeu o ofício”, comenta.

Douglas diz que tem ideia de inovar e fazer algumas modificações na loja. “Temos que nos atualizar junto com o mercado. Há algumas ideias em andamento”, compartilha.

Há mais de 40 anos

Peyerl também relembra como ao profissão ganhou espaço em sua vida. Aos 13 anos de idade, ele começou a trabalhar em uma empresa do ramo na cidade, a Calçados Fredor, que hoje já não existe mais.

“Naquela época, em 1989, 1990, existiam quase 30 empresas de sapataria na cidade – e todas elas fecharam. Hoje, Timbó tem três sapatarias e digo por experiência que para dar certo e dar conta dos pedidos é preciso ter, no mínimo, três pessoas trabalhando ali”, argumenta o sapateiro.

Ele relata também que, conforme as empresas iam fechando, começou a comprar os maquinários – cerca de 90% de tudo o que foi vendido na época. Mas, apesar de ter os equipamentos necessários, admite que isso não é o suficiente.

“Os materiais dos calçados mudam muito todos os dias, a cada nova coleção. É sempre preciso ir atrás e se atualizar, afinal, se você vê que algo não ficou como queria, que não está bom, é porque não está sendo feito da forma correta”, esclarece.

Novidades no ramo

Peyerl revela que até sente vontade de ensinar jovens a aprender o ofício, porém, diante dos custos que a contratação de mais um funcionário implicaria – além da alteração nos valores dos consertos de calçados que hoje são cobrados – ele declara que acaba se tornando algo inviável.

Agora, a partir do mês de abril, é que a sapataria entra em sua melhor fase, quando mais recebe serviços – tanto que, quando chegamos na empresa para entrevista-lo, a correria de pai e filho era grande e os pedidos não tinham fim.

“Tem que trabalhar muito e isso é fato, nada cai do céu. Digo que, se tem algo que facilitou muito nosso trabalho e principalmente a comunicação com os clientes, é o WhatsApp. As pessoas mandam as fotos do calçados e tiram as dúvidas, tudo por ali. Ajuda muito”, diz.

Além dos sapatos, a Sapataria Peyerl também realiza serviços e consertos em bolsas, malas, cintos, fabrica pulseiras de relógio e tem inúmeras opções para os clientes, garantindo a solução de (quase) todos os problemas.

Há ainda uma novidade que a família nos conta. Recentemente, passaram também a fabricar peças de guarda-pó para máquinas. “Quem faz a costura é minha mulher, junto com nossa nora. Hoje, nosso cliente para esse serviço é a Porcelanas Germer, mas estamos firmando mais uma parceria com outra empresa de Timbó”, comenta.

Gratidão e muitas conquistas

Após mais de quatro décadas se dedicando a essa profissão, Peyerl admite que já tentou larga-la uma vez, mas a paixão pelo seu trabalho é tanta que não resistiu e retomou as atividades.

“Hoje ainda penso em fechar. Meu filho vez e outra diz que vai se mudar para os Estados Unidos. Se isso realmente acontecer, não teria como manter as atividades então eu fecharia ou alugaria isso aqui”, anuncia.

Mas essa decisão com certeza não é por falta de dedicação ou vontade de trabalhar, muito pelo contrário. O empresário diz que, olhando para trás, se pudesse voltar no tempo, faria tudo igual.

“Quando você gosta do que faz aquilo flui naturalmente, é incrível. Me sinto realizado na minha profissão, agradecido por tudo o que conquistei no decorrer desses anos. Foi sendo sapateiro que construí minha casa, criei meus filhos e tenho uma vida boa.

E pensar que, quando tive coragem de abrir minha própria empresa, Timbó tinha apenas 5 mil habitantes. Atendo há gerações aqui, pessoas que confiam no trabalho que fazemos, amizades que conquistamos e isso não tem preço. Olho para o passado orgulhoso de tudo que vivi e conquistei até hoje”, agradece.