Sua essência é ter ou ser?

A psicóloga Bruna Seidel avalia as relações humanas hoje e fala sobre a importância de cuidar não somente da vida financeira, mas principalmente da saúde mental

Por Aline Christina Brehmer 18/01/2019 - 14:43 hs
Foto: Jornal Café Impresso/Aline

Estamos no Janeiro Branco, mês voltado à conscientização e importância sobre cuidar da saúde mental, que hoje é prejudicada por vários fatores, sendo o financeiro um dos principais.

Fato é que o início do ano sempre se mostra perfeito para traçar planos e metas. O sentimento de recomeço ganha força, mobilizando sonhos e projetos – mas o erro é sempre focar no ter ao invés do ser.

A perda de um emprego ou estilo de vida acaba atingindo a autoestima e prospecção das pessoas, causando uma crise de identidade e gerando depressão ou estresse pós-traumático. O que fazer então?

“Muitas vezes a pessoa não tem todo o dinheiro que gostaria, mas tem outros motivos para se sentir bem e feliz, porém, o foco no objetivo de ter mais e mais faz com que essa pessoa não consiga dar o merecido valor ao que vive”, reflete a psicóloga Bruna Seidel.

Ela destaca que não se pode ser negligente e dizer que a falta de dinheiro não prejudica a saúde mental, porque prejudica sim. A pessoa que tem uma vida financeira estável de acordo com a sua realidade, tem mais chances de manter sua saúde mental organizada.

“Difícil você ver sua casa caindo, você sem dinheiro para reforma-la e mesmo assim manter sua saúde mental saudável, não é mesmo? O fato é que não devemos nos apoiar no que temos para nos sentirmos felizes. Precisamos valorizar o que somos e com base nisso fazer boas escolhas para colher frutos saudáveis”, complementa a psicóloga.

Guerra de egos

Mas não é somente o orçamento que compromete a saúde mental. Bruna volta um pouco no tempo para relembrar um período marcado pela falta de empatia entre desconhecidos, conhecidos, amigos e até mesmo familiares: as eleições que aconteceram em 2018.

Em uma análise profissional, ela revela se sentir preocupada e abismada com tudo o que viu e vivenciou. “Ninguém parou para se perguntar o porquê do outro ter aquela opinião. A regra era atacar verbalmente quem pensasse diferente. Na minha opinião foi um período sem diálogos, marcado por uma guerra de egos. Sinceramente espero que a expectativa de que 2019 seja um ano melhor acabe de cumprindo porquê, pelo o que vi, a maioria das pessoas colocou toda a sua fé nisso, principalmente na parte de ascensão financeira. Qualquer coisa que saia desse rumo pode gerar frustrações sem precedentes”, alerta a psicóloga.

Preciso ser o melhor sempre?

Outro assunto abordado por Bruna é a cobrança imposta pela sociedade e outras pessoas ao que se julga ser “o ideal”. “Em uma geração onde as pessoas se sentem cobradas para serem as melhores em tudo, sempre à frente e proibidas de cometerem erros, uma dica pode salvar tudo, e ela é: se permita sofrer. Você pode não estar bem, é seu direito. Você pode ficar quieto e recluso se preferir, é sua vida, sua saúde mental. Ninguém precisa estar bem 24 horas por dia, cobrar isso sobrecarrega nossa mente e nos desgasta muito”, aconselha.

Diante disso, Bruna cita um livro que leu recentemente, intitulado “Felicidade dá lucro”. “Isso quer dizer que pessoas felizes rendem mais, tanto na vida pessoal quanto profissional. Até me arrisco a dizer que as empresas também têm responsabilidade para com a saúde mental de seus funcionários. Se eles estiverem bem e felizes, irão render mais. É um investimento no capital humano que reflete no mundo dos negócios”, diz.

Uma vida pautada em likes e status

Bruna vê que em uma realidade onde tanta gente se pauta pela quantidade de likes nas fotos em redes sociais, por ter o celular de última geração, por necessitar de “bengalas” que deem suporte para sua própria aceitação o tempo inteiro acabam sendo as crianças que, curiosamente, se mostram o reflexo de uma mente realmente saudável, consciente e promissora.

“Tive a alegria de no ano passado trabalhar na rede de ensino. As crianças, na faixa dos seis aos sete anos, são realmente incríveis. Se preocupam com os colegas, são intelectualmente evoluídas, vejo como uma geração que vai crescer vendo o que precisa melhorar e fazendo a diferença, por isso a tendência é que as coisas melhorem no futuro, que os seres humanos se tornem mais conscientes”, opina.

Bruna destaca que uma das mais graves agressões à saúde mental é não se aceitar como é. “A pessoa procura outra vida, se espelha em situações que não condizem com a realidade na qual vive, indo em comum acordo com a massa sem questionar o porquê disso. Quando ela não consegue atingir ou adaptar aqueles planos (que não são os dela) à sua realidade acaba se frustrando muito”, analisa a psicóloga.

O desafio de aceitar a própria dor

Mas e para a geração adulta de hoje, qual é o melhor caminho? Bruna é enfática: é preciso se conectar com a própria dor, aceita-la e aprender a conviver com isso.

“Encare de frente, coloque o dedo na ferida, não existe outro jeito. Se você não resolver seus conflitos internos eles vão se acumular e sua mente vai adoecer. É como uma ferida que vira cicatriz. O machucado já não dói mais depois de ser tratado, mas a marca vai sempre existir e tudo bem, você aprende a conviver com isso”, compara.

Para a psicóloga, muitas pessoas veem a procura por um apoio psicológico com certo receio e resistência. “Existem vários tipos de médico. Se você está com dor de dente, cabeça, no joelho, estômago, você procura essas especialidades. Mas e quando sua mente está doente? Ela também precisa de tratamento e ajuda, não negue isso a si mesmo”, aconselha.